terça-feira, 13 de novembro de 2012

normopatia, aversão às ideologias (anti intelectualismo), escassez:
individualismo pragmático
VEJAO TEMPO online mudou, nunca foi tão em VOGA ter posicionamentos reacionários aos Direitos humanos como agora. ¿21 - 12 - 2012?

Os "super produtivos" antolhos para a realidade social, contribuem altamente para o sossego das Elites que precisam apenas de Capim para fazer dos seus Cavalos instrumento dócil e prático.

Desta forma, estes Servos puxam até hoje carruagens pesadas, fazendo a tarefa de ir e vir à aqueles que por entender a Riqueza como a construção de suntuosos monumentos externos, privam os seus Iguaisdo uso fruto compartilhado dos bens materiais.

Sem falar do aparato técnico que se utiliza para dar repercussão as escrotices publicadas. Na boa galera, larguem esse trampo e vão pescar. Vcs não foram feitos pra isso.

terça-feira, 29 de março de 2011

O Minério Radioativo do Amazonas e as Usinas Atômicas Japonesas (publicado originalmente em http://urubui.blogspot.com/)


O Minério Radioativo do Amazonas e as Usinas Atômicas Japonesas

Presidente Figueiredo, Amazonas, 1992: estávamos construindo a Casa da Cultura do Urubuí. Doroti, eu e as crianças ajudávamos na cobertura de cavaco. Há nossa frente, pela BR-174, roncavam caminhões carregados de minério procedentes da mina do Pitinga. Oficialmente as carretas levavam apenas cassiterita ou estanho. Em verdade, carregavam diversos minérios estratégicos, todos bem mais caros do que o estanho: ítrio, tântalo, colúmbio, urânio, criolita, ouro. A BR-174 tornou-se mais uma “veia aberta da America Latina”. O diretor do setor mineral do Mercado Comum Europeu garantia em reunião em Duisburg / Alemanha / 1991 que todo o minério do Pitinga estava sendo vendido no mercado negro, confirmando conclusão a que o geógrafo e pesquisador da UFAM, José Aldemir de Oliveira chegou em sua tese de doutorado intitulada: “Cidades na Selva”.
A área da mina do Pitinga, 526.000 hectares, foi invadida pela Paranapanema em 1979 e roubada pelo Governo Figueiredo do povo indígena Waimiri-Atroari em 1981. Da maracutaia nasceu o nome de batismo de nosso município: Presidente Figueiredo.

Num daqueles dias, do alto da Casa da Cultura do Urubuí, estranhamos a grande quantidade de carretas que vinha em sentido contrário, de Manaus para Pitinga, também carregadas de minério. Informei-me sobre o por que daquilo. Li conscientemente os jornais e revistas, principalmente as noticias que tinham referencia ao Japão, pois duas firmas japonesas, a Marubini e o Industrial Bank of Japan, controlavam então a Mina do Pitinga. E sabíamos que lavravam ali minério radioativo. Por outro lado, o parlamento japonês exigia das empresas que importavam material radioativo, um destino, fora do Japão, para o lixo radioativo. Os noticiários sobre navios que percorriam os mares contendo lixo atômico, sem saber que destino dar também eram freqüentes. E aqui, próximo ao aeroporto de Manaus, ocorreram dois acidentes aéreos e corriam boatos de que a causa seria minério radioativo, estocado pela Paranapanema nas imediações do aeroporto que interferia nos equipamentos dos aviões.

Tudo isso me fez levantar a hipótese e denunciar que as carretas que seguiam carregadas rumo à mina do Pitinga levavam lixo radioativo. A movimentação dessas carretas durou aproximadamente 4 meses. Falava-se que teriam transportado 5.000 toneladas do estranho material para dentro do nosso município.

A imprensa publicou a minha denúncia, mas em resposta entrevistava apenas geólogos e autoridades conhecidamente comprometidos com as empresas de mineração que obviamente negavam tudo. Nunca foi feita uma investigação séria sobre o assunto. Também não me processaram por calúnia. E o problema continua a pairar sobre os índios Waimiri-Atroari e a população local como uma bomba-relógio até hoje.

Queixas de trabalhadores da mina do Pitinga sobre males estranhos que sentem no corpo; fraquezas gerais; doenças sem causa aparente... E funcionários da empresa começaram a se abrir conosco sobre estes problemas. Um deles, guarda do canil da firma, trabalhava há poucos metros do local onde o lixo foi enterrado. Sempre que nos visitava se queixava de dores no corpo até que decidiu sair da mina, já sem condições de continuar o seu trabalho. Hoje mora em Brasília, onde procura em vão por justiça. Outro jovem robusto ficava ofegante ao subir a escada de 15 degraus da Casa da Cultura do Urubuí. Há poucos meses um vereador falou da proliferação do câncer no município. Muitos manifestam os problemas que sentem, outros guardam segredo com medo de sofrerem represálias da firma.

E lá no Japão milhões de inocentes pagam hoje pela maldição que donos de empresas japonesas e governantes corruptos, de lá e de cá, armaram sobre suas cabeças. Naquele tempo, os jornais publicavam protestos de ecologistas contra o transporte de plutônio, material altamente radioativo que o navio japonês Akatsuki Maru transportava da França para o Japão, cujo roteiro foi mantido em sigilo absoluto (ver Revista Veja 11-11-1992: “Chernobyl Flutuante”). É preciso animar a juventude a reagir em tempo contra quem ameaça o futuro da vida na terra; contra quem constrói monstros radioativos ou usinas atômicas sob controle de poucos; contra quem alastra sempre mais as metrópoles comandadas por leis escritas que abafam as consciências; contra a construção sem controle e sem limites de fábricas de carros e de plásticos; contra quem cobre a mãe-terra de asfalto e cimento; contra agro-negociantes que liquidam a biodiversidade em grandes extensões e envenenam a terra; contra os governantes que constroem grandes barragens para hidrelétricas passando por cima de povos e comunidades; contra quem negocia as florestas da Amazônia com exportadores de madeira.

Respeito e carinho para com a diversidade da vida que cobre a mãe-terra, enriquecida pela ação criadora das pessoas podem transformar esse paradigma hoje reinante em mesas fartas e comunidades sorridentes.


Casa da Cultura do Urubuí /Amazonas, 25 de março de 2011.


Egydio Schwade

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011


A Bienal de Arte de São Paulo, maior evento do gênero na América e um dos mais antigos no mundo (juntamente com a Bienal de Veneza) passou por recentes crises ligadas à má admnistração do evento e à própria crise da arte contemporânea. Estes problemas se refletiram na penúltima bienal, na qual ocorreram eventos como a pichação do edifício por um grupo de artistas/ativistas. Havia nesta bienal um pavimento vazio, resposta da curadoria para a crise, e justamente aí ocorreu a ação polêmica. Os autores reivindicavam a renovação do evento e uma posição politicamente mais clara da arte[1]. Em tempo, o pavimento vazio acabou dando à bienal de 2008 o apelido pejorativo de Bienal do Vazio...

A curadoria da bienal de 2010 parece ter entendido melhor a mensagem, a julgar pelos trabalhos atualmente em exposição no Palácio das Artes em Belo Horizonte. Belo Horizonte?! Mas não estamos falando da bienal de São Paulo? Pois é, a proposta de levar uma seleção do que foi exposto em 2010 para diversas capitais do país é parte da necessária revisão de proposta da bienal. O eixo curatorial foi o da arte/política em diversos graus de relação que tais termos possam suscitar. A resposta interessante é talvez a única possível diante dos problemas enfrentados pela arte, pela própria bienal e pelo mundo convulsivo em que vivemos hoje. Mundo no qual, talvez, sempre tenhamos vivido, o recorte atual serve para mostrar que os trabalhos falam dos problemas de hoje, espaço de tempo onde se inserem seus questionamentos e sua propostas.

Belo Horizonte, primeira cidade visitada pelas obras contundentes recebe-as em um momento muito oportuno. Além das obras mais recentes foi feito um recorte histórico, no qual predominam obras dos anos 60 e 70, algumas delas incluídas na polêmica exposição de abertura do Palácio das Artes, mesmo centro cultural em que estão expostas agora. Na mesma época o Brasil vivia uma ditadura militar e o pós guerra na Europa e nos Estados Unidos trazia enorme efervescência político-cultural. São obras germinais para o contexto sócio-cultural do país e muitos dos trabalhos de jovens artistas contemporâneos presentes na exposição trazem explícita referência ao mesmo período histórico. Época de contestação dos limites entre democracia e autoritarismo, é possível fazer um paralelo perturbador com a realidade atual em que o prefeito eleito de Belo Horizonte age como um autoritário ditador, e não é o único ao redor do mundo...

Contudo, chama a atenção um trabalho mais contemporâneo e que não se utiliza de sangue, suor ou lágrimas – ao menos não de forma tão óbvia quanto a maioria: -Trata-se do "Centro de Pesquisa da Normalidade Brasileira", de Jimmie Durham USA
Neste trabalho o artista simplesmente coloca em uma sala uma série de objetos, cortes de jornais, revistas, fotografias e trechos de tratados de sociologia brasileiros, em um resultado desconcertante. Neste verdadeiro museu de costumes o que se desenha não é um paraíso tropical, mas um lugar rico em todo tipo de violência. Não falo da violência contra o turista gringo assaltado nas praias do Rio, mas sim da violência cotidiana de 500 anos num país que insiste em usar o sangue de seu próprio povo como lubrificante para a própria economia.  O olhar estrangeiro permitiu ao artista salientar detalhes que subvertem algumas noções históricas correntes no Brasil, especialmente o papel de dominados e dominadores. A montagem permite ver como os brasileiros não são apenas vítimas do domínio imperialista europeu ou estadunidense. Somos também algozes de nós mesmos e nos recusamos a reconhecer nossa própria nação. Frequentemente imitamos de modo grotesco os povos que declaramos algumas vezes como exploradores, e outras como salvadores. Tememos uma barbárie que ousa enfrentar o calor dos trópicos com a verdade da nudez. Alguns ingênuos poderiam dizer que o artista foi hipócrita, ele que vem de um dos países mais violentos do planeta, ou que ele não entende a cultura local. Eu como brasileiro não teria dificuldade em usar da “antropofagia brasileira”[2] para dizer que a visão dele é válida, interessante e por isso mesmo deve ser ingerida por nós. Aí mesmo se insere a potência da obra, ela não é ilegível para o “outro”, ela mostra que somos o outro. Os ocidentais só identificam esse outro pela diferença, algumas vezes encaixando-o na expressão macia do multiculturalismo. Não se lembra que multiculturalismo é uma expressão que já invoca em si um preconceito ao distanciar distintos grupos humanos, culturas diferentes. Já dizia o poeta romano Terêncio “eu sou homem e nada que é humano me é estranho”. Não é sem razão que o objeto que mais me impressionou da sala de Jimmie Durham, colocado na parede em posição de destaque, é um espelho.


[1] A resposta dos organizadores da “Bienal do Vazio” aos manifestantes foi chamar a polícia e processá-los, o que salientou a necessidade de uma revisão da relação entre o evento e a cidade.

domingo, 20 de junho de 2010

COISAS QUE POSSUEM MENTE


 razão de todas as razões?


luciano carlos cunha - 09/06/2010 


"você já se perguntou o que faz com que alguém seja vendido?





é claro. todos nós vivemos num mundo onde estamos rodeados o tempo todo por coisas que são vendidas. as coisas vendidas são chamadas mercadorias. nascemos e vivemos tão acostumados com isso que talvez nunca tenhamos parado para pensar para que serve o conceito de mercadoria.






bom. para começar, uma mercadoria é um item de propriedade, e como tal, ela tem um dono, um proprietário. mas, vamos lembrar de onde iniciamos a questão: "o que faz com que alguém seja vendido?". uma mercadoria só é vendida por um preço, um valor. e uma mercadoria só é mercadoria por ter um valor que está fora dela. os outros dão esse valor. dependendo do quanto a mercadoria favoreça aos interesses do seu proprietário, ela será mais ou menos valorizada. por definição, um item de propriedade é algo que só tem valor instrumental, condicional, extrínseco. é por isso também que uma mercadoria é chamada uma coisa. compreendemos bem quando dizemos isso de um relógio ou de uma laranja. nem um relógio nem uma laranja conseguem ver valor em sua própria existência, porque falta-lhes uma mente. assim, os donos de relógios e laranjas podem fazer o que bem entenderem com seus itens de propriedade (vender, dar, trocar e até mesmo destruir), pois esses itens não podem sofrer um mal1










até aí parece tudo muito simples. mas, a coisa fica intrigante quando perguntamos porque é que alguns seres que claramente possuem uma mente são vendidos. se são vendidos, é porque são considerados coisas - o comprador tem o direito de propriedade sobre a coisa, e pode fazer com ela o que bem entender. aqueles seres vivos que separam-se de sua fonte de provimento ao nascerem precisam da mente para moverem-se com segurança no ambiente2. é por isso que os chamamos animais, pois são animados (dotados de movimento por ação própria - diferentemente por exemplo, de um cata-ventos, que só pode mover-se por forças externas). e é claro, seres humanos também estão incluídos nessa categoria de seres animados. 




um centro de testes cosméticos nos EUA



a nossa busca está cada vez mais intrigante porque, claramente vemos que em nossa sociedade, alguns animais são vendidos e com relação a outros, achamos repugnante a idéia de vendê-los. Se quisermos sustentar firmemente nossa posição, para não sermos acusados de irracionalidade, precisamos demonstrar alguma diferença que exista entre os animais que podem ser vendidos e os que não podem. uma diferença que diga que alguns animais devem ser agrupados junto com relógios e laranjas e que outros animais são tão diferentes dos primeiros que devem ser colocados em um grupo separado. 






podemos iniciar nossa análise com relação aos seres humanos. há algum tempo atrás (e não faz muito tempo), humanos de pele negra eram considerados itens de propriedade dos humanos de pele branca. também as mulheres, já foram consideradas itens de propriedade dos homens. hoje em dia, achamos repugnante a idéia de que um ser humano possa ser vendido. a noção de que cada um de nós possui uma existência psicológica (e não meramente biológica como uma laranja, por exemplo) faz nos enxergarmos como possuindo o direito de não sermos utilizados como se fôssemos uma mercadoria, uma fonte renovável, um modelo de testes, como se só tivéssemos valor enquanto servíssemos aos interesses dos outros, enfim, como se fôssemos meros meios para fins de outros3. é por esse motivo que consideramos a escravidão como algo repugnante: diferentemente de laranjas ou relógios, nos importamos com o que acontece conosco, e podemos ser atingidos maleficamente por alguma ação ou omissão de terceiros. por possuirmos um bem-próprio e nos importarmos com o que acontece conosco, nosso valor é inerente4, e não instrumental. sentimos que nossa vida, integridade física e liberdade de movimento não têm preço. elas não podem ser compradas. 

tratar um indivíduo que possui uma mente como se fosse uma mercadoria é rebaixá-lo ao estatuto de coisa, é mostrar desrespeito pelos seu valor inerente e seus interesses. quando se trata de seres humanos, nós concordamos prontamente com todos esses princípios. mas, se somos realmente racionais, precisamos então explicar porque deveria ser diferente com relação a membros de outras espécies. em suma, por que respeitar um interesse de não ser usado como uma coisa, de não ser escravizado, em um ser de nossa espécie, e não no de outra? o que nos torna tão especiais? 

alguns dizem: é porque humanos são de nossa espécie. mas isso é como dizer que "humanos são humanos", e isso já sabemos. queremos saber o que torna todos os humanos tão especiais. muitos apontam a capacidade para a razão plena. mas assim estariam excluídos nossos bebês, as crianças muito pequenas, os humanos com graves lesões cerebrais, e os idosos senis. além disso, muitos animais não-humanos possuem níveis de raciocínio muito acima do deles. idosos senis podem já ter tido a razão desenvolvida um dia e bebês saudáveis podem ainda vir a desenvolvê-la, mas certos humanos passarão a vida inteira no mesmo estado (de não ter a posse plena da razão mas poder desfrutar de sua vida prazerosamente) e nem por isso os utilizamos como se fossem nossos recursos. resumindo, não há como traçar uma linha divisória com base em capacidades cognitivas, que coloque todos os humanos acima da linha e todos os não-humanos abaixo5

as tentativas do parágrafo anterior de apontar uma diferença entre humanos e não-humanos não foram bem-sucedidas porque tiravam uma conclusão que não tinha a ver com o assunto das premissas. as premissas diziam respeito a alguém por esse alguém ter o interesse em não ser usado como se fosse uma coisa, e a capacidade para a razão plena nada tem a ver com isso. para sofrer um mal, basta ser senciente (possuir a capacidade de sofrer/ desfrutar da vida). nisso, nos igualamos aos outros animais, pois somos dotados de mente. se não conseguimos apontar uma diferença moralmente relevante entre humanos e não-humanos que justifique a diferença no tratamento, é sinal de que nós, que nos auto-proclamamos racionais, estamos embasados num preconceito irracional, de aparências: o especismo6, (assim como o racismo e o sexismo). se não há mérito ou demérito por alguém ter nascido com este ou aquele formato de corpo (raça, sexo ou espécie), pois, não resulta de investimento pessoal7(qualquer um de nós poderia ter nascido com rabo, patas e bico), como usar essas características para justificar usar o outro como se fosse uma coisa? dessa forma, se somos racionais, precisamos estender aos não-humanos o mesmo direito moral básico8 de não ser usado como mero meio para fins de outros (por exemplo, como um item de propriedade), seja para qual fim for: alimentação, experimentos, vestimenta, entretenimento. e não importa se essas práticas são feitas sem dor ou não, com morte ou não: todas elas violam o princípio básico de que seres com uma mente não são coisas. 



ainda há outra questão intrigante. algumas pessoas defendem que é errado escravizar, torturar, matar, vender seres humanos e certos seres não-humanos (como cachorros ou gatos), mas não vêem nada de errado em fazer isso com galinhas, bois, vacas, porcos, etc. essa diferenciação é ainda mais difícil de entender, e não pode ser explicada a não ser por um outro preconceito semelhante ao primeiro tipo de especismo (o elitista, que coloca os seres humanos como uma elite): o especismo eletivo9 (onde se escolhe uma espécie para respeitar enquanto se continua a fazer uso de todas as outras). isso só pode ser explicado através de uma preferência sentimental que alguns tem por certos formatos de corpo. não haveria problema algum com essa preferência se as pessoas não pensassem que o respeito que elas devem se mede pela quantidade de amor que elas sentem. amar é opção, respeitar é dever10. e o respeito depende apenas das características do paciente da ação (se este pode ou não sofrer um mal), e não de sensações subjetivas na mente do agente (porque o paciente pode continuar a sofrer o mal, quer o amemos, quer o odiemos). 


assim sendo, a única posição coerente, com relação ao que estávamos investigando sobre o conceito de propriedade é: separarmos de um lado, as coisas (sem mente) que podem ser itens de propriedade e de outro, os indivíduos (que passam a ter o direito de não serem usados). com isso, necessitamos da abolição11 do uso de animais (tanto humanos quanto não humanos) enquanto itens de propriedade de seres humanos, não meramente sua regulamentação (pois nenhum defensor sério dos direitos humanos defende a regulamentação do estupro), simplesmente porque regulamentar a escravidão é torná-la mais forte e mais bem-vista aos olhos do público."




Notas
1 Cf. Gary L. FRANCIONE. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000, capítulo 3.
2 Sobre essa definição de animal, ver Arthur SCHOPENHAUER. O Mundo Como Vontade e Como Representação. São Paulo, Unesp, 2005, p. 214-215.
3 Cf. Tom REGAN. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 85.
4 Id, p. 84.
5 Cf. Peter SINGER. The Significance of Animal Suffering. In: BAIRD, Rober M. & ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. Amherst, NY: Prometheus Books, 1991, p. 57.
6 Cf. Richard D. RYDER. Speciesism. In: ________. Victims of Science: the use of animals inresearch [1975]. Revised edition 1983. London: Centaur Press; National Anti-Vivisection Society Limited, 1983, p. 5.
7 Cf. FELIPE, Sônia T. . Fundamentação ética dos direitos animais. O legado de Humphry Primatt. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 1, 2006, p. 219.
8 Cf. Gary L. FRANCIONE. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000, p. 92-102.

9 Os termos especismo elitista e especismo eletivo são utilizados pela filósofa Sônia T. FELIPE. Ver entrevista em http://www.pensataanimal.net/index.php?option=com_content&view=article&id=66:




10 Agradeço a sugestão dessa frase a Maurício Varallo.
11 Cf. Tom REGAN. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 77.

Referências






FELIPE, Sônia T. . Fundamentação ética dos direitos animais. O legado de Humphry Primatt. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 1, p. 207-230, 2006.

FRANCIONE, Gary L. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000.

REGAN, Tom. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 77-88.

RYDER, Richard D. Speciesism. In: ________. Victms of Science: the use of animals in research [1975]. Revised edition 1983. London: Centaur Press; National Anti-Vivisection Society Limited, 1983, p. 1-14

SCHOPENHAUER, Arthur. O Mundo Como Vontade e Como Representação. São Paulo, Unesp, 2005


SINGER, Peter. The Significance of Animal Suffering. In: BAIRD, Rober M. & ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. Amherst, NY: Prometheus Books, 1991, pp 57-65.










Luciano Carlos Cunha - luciano@pensataanimal.net
Mestre em Ética pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), licenciado em Educação Artística com habilitação em música pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e colaborador da revista Pensata Animal.

terça-feira, 8 de junho de 2010

as rosas não falam
 

memento mori - encontrado nas ruínas de pompéia


em homenagem aos 200 anos de independência de nuestros hermanos argentinos e diante do chocante ataque que assistimos contra um navio de ajuda humanitária na palestina resolvi falar sobre temas profundos, duros, difíceis para leitores e mesmo para mim. 

voltei há um mês da terra do alfajor e foi a terceira viagem que fui pra lá em menos de um ano. é impossível não ficar fascinado e intrigado pela decadende/maravilhosa buenos aires, e seu povo idem. marcados por uma ditadura que matou mais de trinta mil pessoas ao que parece a argentina segue sem se conciliar consigo mesma, a política toma uma trajetória em que todos tentam destruir todos. segundo luis fanlo, sociólogo da universidade de buenos aires (uba) e grande estudioso de temas como argentinidade e brasilidade - que nem ele sabe se existem - o argentino de hoje é um povo amargo, individualista, pouco aberto a autocrítica ainda que extremamente crítico de tudo que lhe é estranho. o discurso violento se reflete em todos os lugares, desde as brigas na esfera política nacional até as frases cotidianas. a indisposição à visão do outro, o modo ritualístico de encarar cada gesto é difícil de compreender aos nossos olhos brasileiros, mas por vezes resulta em semelhanças como o desrespeito a acordos e leis. caminhos opostos que chegam ao mesmo ponto, como dizem os chineses: tudo que é extremo se torna o seu contrário.


sobre o interessante luis fanlo

nós aqui na terra dos papagaios por tradição somos um povo que evita rupturas, revoluções. não que o passado seja isento de sangue, mas comparativamente aos hermanos a coisa sempre foi mais, digamos, enxuta. o lado negativo? é difícil no nosso caso observar uma política partidária coerente e todos se vêem na obrigação de perdoar a todos por todos os erros. claro, somos um país em fase de transformação intensa e parece que para melhor. boa oportunidade de sair do comportamento infantil, da mania de esperar sempre a benevolência dos outros e de pensar que isso é praticamente uma regra do cosmos. segundo sérgio buarque de holanda o nosso informalismo e pouco apreço por símbolos muitas vezes parece aos olhos extrangeiros desrespeitoso. aqui o abandono das leis se dá não por uma exacerbação do indivíduo, mas pela transformação de toda a estrutura social em uma forma de intimidade, de relação pessoal. este brasileiro seria antes de tudo um homem "cordial" entendendo-se a expressão cordial menos por uma acepção cortesã e mais por sua etimologia relacionada à palavra latina cordis, ou seja coração. o coração ainda é o grande motor da ação no brasil e por isso somos enormemente apegados à familia mesmo depois da vida adulta, por isso é tão difícil definir relações profissionais, distinguir noções de público e privado, aqui há apenas o amigo ou desconhecido. por tudo isso a própria ideia da construção de uma democracia liberal tem qualquer coisa de exótico. por outro lado talvez seja esta abertura a tudo que vem de fora, ainda que com todos os seus problemas, que explique o atual desenvolvimento do país, mas não me arrisco a dizer para onde estamos caminhando. sem duvida nos falta um pouco da noção de individuo que os argentinos possuem para que olhemos um pouco para dentro, mas como chegar a um ponto de equilibrio sem perder o que possuímos de bom? eu é que não sei.

sobre nosso querido sérgio buarque de holanda, que não é apenas o pai de chico buarque

finalmente tenho que comentar o evento mais recente do conflito israel/palestina, que me deixou um tanto perplexo, ainda que eu saiba do que a humanidade é capaz. falo aqui do ataque de tropas de israel a um navio  em missão de ajuda humanitária que se encaminhava para a palestina. os povos, assim como os indivíduos têm seus códigos e sua história. não raro ocorre de povos deveras diferentes, deveras semelhantes, adentrarem em conflitos que em certo momento ninguém sabe como começaram. são como irmãos brigando por um brinquedo, em dado momento acabam se esquecendo do tal brinquedo, mas por vezes se tornam inimigos pelo resto de suas vidas e desconhecem a razão(!?) de tamanha antipatia. brasil e argentina se chocam culturalmente e  se atraem por essa mesma razão, discutem sobre futebol mas no fundo não é sobre futebol. nesse campo sobre o qual conheço muito pouco parece que cada um dos países reflete sua imagem, seu modus operandi. israel e palestina por sua vez têm um conflito político mascarado de conflito étnico cheio de dores, perdas e justificativas dos dois lados. cabe a nós como humanos vencermos nossa resistência pessoal, nossos hábitos incoscientes, e como indivíduos de pensamento liberto nos abrirmos ao esforço pela compreensão do outro, de seu contexto e sua posição. trata-se de relevar erros do passado por um bem comum com base na mais incrível capacidade humana, a individual capacidade de mudar de ideia observando o ambiente. os seres capazes das coisas mais abomináveis são os seres capazes de fazer arte, de criar noções de ética. para mim esta ética é o mais preciso oposto da violência.

fronteira eua / mexico


sobre o ataque ao comboio humanitário
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2010/06/472495.shtml

a mobilidade das pessoas através das fronteiras é um possível antídoto para superação de preconceitos e estabalecimento de novos laços. não é construindo muros e policiando céus e mares que israel conseguirá a paz. creio que essa é talvez a grande lição que os colonizadores portugueses nos deixaram pois foi incentivando tais laços, inclusive de parentesco, que eles conquistaram meio mundo no século XVI. talvez seja esse o segredo da enorme capacidade de absorção que a cultura brasileira possui com relação aos extrangeiros. as mesmas bases culturais que produzem o vício produzem a virtude, mantenhamos a segunda.

espero enfim que todos os desafortunados que lêem esse blog desconsiderem as citações e comparações por vezes absurdas, mas palavras são palavras nada mais. as coisas, os amores, as obras de arte, as cenas de filme enfim são o que são, e apesar da mania acadêmica de fazer discurso eu afirmo antes de mais nada: toda comparação é sobretudo uma grosseria, falemos menos e vivamos mais! 

deixo uma música que esses dias me tocou pra que se toquem também, é bom sentir o coração pulsar:

http://www.youtube.com/watch?v=dnjaevCMj_o




terça-feira, 25 de maio de 2010

das ditaduras democrática

ok eu sumi por muito tempo, nesse intervalo pra variar viajei, entrei num emprego, saí, voltei, cometi bobagens e não cheguei a ser herói (como a grande maioria de vocês jamais serão). esse blog não quer tratar das loucuras internas, mas das externas, então paremos de conversa e vamos ao trabalho:

Artur Barrio


Rio Arrudas - BH / MG


SITUAÇÃO T/T1 (2a parte), 1970
ação / intervenção urbana


nos últimos meses venho acompanhando um curioso fenômeno observável em algumas nações e regimes ditos democráticos. trata-se da confusão entre a mera existência de eleições e a noção de democracia. não é uma abordagem nova, mas no momento está em ascensão no mundo. não tenho dúvidas de que eleições diretas e universais são importantes instrumentos da democracia, mas até que ponto isso vem legitimando discursos que ferem a construção democrática das sociedades?

pra começo de conversa dizem que é importante definir o conceito. então, o que seria uma democracia? a verdade é que esta curiosa invenção humana não é uma noção facilmente delimitável e que isso é conseqüência de alguns dos melhores pressupostos do próprio telos democrático - http://pt.wikipedia.org/wiki/Telos_(filosofia).  em lugar de delimitar falemos por meio de exemplos, bons e ruins. aceite-se aqui a minha noção tão torta e maniqueísta quanto útil, o blog é meu afinal.

sarkozy tenta proibir o uso de burcas na frança, com a imposição de pesadas multas a quem desrespeitar a lei. creio que assim ele age de modo antidemocrático e invasivo, ataca a liberdade de credo ou mesmo a simples liberdade de uma pessoa escolher como deseja se vestir em uma festa à fantasia. imposição digna de um monarca absolutista e possivelmente algo para distrair a população de algum tema mais sério que afete o país, felicitando favoráveis e irritando contrários à questão, um passatempo maquiavélico. naturalmente, pelos próprios preceitos da república francesa, um marido não pode ter o direito de obrigar sua mulher a se vestir de tal ou qual maneira. se este fosse o limite das novas regras, ainda que com todas as complexidades envolvidas na questão, sinto que a lei estaria de acordo com a liberdade individual tão pregada no país do croissant desde o século das luzes, época em que a frança era mais dada a pães e brioches. a mulher que por vontade própria preferir se mostrar apenas ao marido não deveria ser impedida de fazê-lo, ainda que no seu documento de identidade tenha que colocar uma foto de rosto. a separação tão clara quanto possível entre público e privado, entre estado laico e religião seria melhor preservada e seguiria inspirando outras nações e outras leis rumo à uma situação menos repressiva no mundo ao longo dos anos se a direita evitasse ser psicopata e a esquerda neurótica.
sobre burcas e sarkozy:
sobre eleições e crise da frança
  
no país onde todo mundo diz que é de centro-esquerda (aquela nação que só anda calçada quando está de chuteiras) imprensa e boa parte da elite dirigente ignoram um fenômeno como a candidatura de marina silva  , em minha opinião situação semelhante de hipocrisia de distorção do jogo democrático. venho observando o ocorrido em abordagens jornalísticas como a da revista época, que criou um blog para acompanhar os candidatos dilma roussef e josé serra, e nenhum outro. há desrespeito à democracia na polarização pressionada entre pt e psdb que ignora fatos importantes. marina, em um partido de pequena expressão numérica, sem grandes espaços de exposição ou militância, possui apoio de cerca de 10% dos eleitores em um país de 200 milhões de pessoas. ignorá-la é ignorar a opinião de cerca de 20 milhões de pessoas, ou aproximadamente o estado de minas gerais. seria democrático negar espaço a uma parcela tão significativa da população? população que se posiciona assim de modo espontâneo. além desse absurdo os outros candidatos de partidos ainda mais nanicos simplesmente são desconhecidos e praticamente não tem chance de oferecer propostas e falar a grandes grupos da população, ciro que possuia patamar semelhante ao de marina foi leiloado pelo próprio partido em troca de cargos em um futuro governo dilma, caso esta se eleja. disso resulta a falta de debate real, e a parceria das auto proclamadas centro-esquerdas de pt e psdb com monstros corruptos da direita enrustida e ignorante, pmdb e dem. todos sabemos que curiosamente, o partido democrata e o partido do movimento democrático brasileiro acolhem grande parte dos antigos apoiadores da ditadura oficial miltar. talvez fosse melhor uma conversa entre pt e psdb para o futuro do país, talvez marina pudesse fazer essa ponte entre as melhores cabeças de cada partido. mas a própria idéia de pensar nessas coisas parecerá bizarra pois nos acostumamos a pensar que o jogo já foi jogado. isso vai ser repetido em nossa cabeça tantas vezes que vai ficar difícil admitir que o futuro ainda não aconteceu e depende de nossos atos. a moda é ser agressivo e dissimulado, todos querem lobos em pele de cordeiro.
como ministra, dilma era impositiva e pouco aberta ao diálogo. obediente ao patrão, era o trator, a face menos simpática do “lulinha paz e amor” especialmente no que concernia na relação entre poder executivo e congresso. agora foi imposta como candidata dentro do próprio pt, que por sua vez vem impondo candidatos nos estados para criar seu palanque, ainda que alguns deles estejam muito distantes dos ideais pregados historicamente no partido(link so). dilma impôs e foi imposta, não surgiu das bases nem tem tempo de partido(a candidata se filiou ao pt em 2001).
sobre dilma
http://pt.wikipedia.org/wiki/Dilma_Rousseff (ok eu sei que a wiki pode receber mentirinhas, mas vá lá)
sobre hélio costa
josé serra por sua vez decidiu desde a juventude que seria presidente, sabe-se lá o porque desse desejo. como governador reprimiu grevistas e favelados, não era dado a conversa mas são paulo é um estado rico, como diria o getúlio vargas (aquele outro ditador democrático). ali não há bom debate político pois há muita grana ela é o que comanda, pobres não precisam ter voz ou vez e a classe média não pode reclamar por viver melhor que a média do país envolta. como diz um amigo próximo, apenas dois de nossos presidentes chegaram ao cargo pelo mero capricho de ocupar o cargo maior da nação, jânio e collor, quem tem alguma memória que tente se lembrar o que houve com eles e com o Brasil.
sobre jânio e collor
sobre serra



finalmente, trazendo o tema à minha “aldeia”, a doce e boba belo horizonte, uma região metropolitana do tamanho de madrid com o dinamismo de tegucigalpa, sem ofensas a mineiros e/ou hondurenhos. temos atualmente uma administração municipal que deveria dar classes de ditadurismo democrático para o mundo inteiro, e que encontra fieis defensores entre alguns de seus cidadãos. eleito de maneira condicional e turbulenta, o candidato foi uma construção artificial que passou apertado ao segundo turno mesmo apoiado por políticos poderosos. uma escolha de sofia para belo horizonte, o prefeito márcio lacerda e seus lacaios jogam no lixo a tradição de administração partilhada da cidade, ignoram desejos da população, pois, como bom tecnocrata, acha que sabe melhor que as pessoas o que elas realmente necessitam. fiscais da prefeitura vêm servindo para repressão de manifestações políticas legítimas e pacíficas no centro da cidade. desviados inclusive de sua função original, tentaram até impedir também que índios e artistas vendessem artesanato em eventos recentes, além de botar em prática uma lei esquecida(sim tal lei existe!) proibindo o uso de bolas, bicicletas e pipas nos parques cada vez mais descuidados da cidade, além dos animas de estimação. proíbiram eventos em áreas criadas para tal fim no meio urbano, depois voltando atrás diante da pressão popular, mas instituindo taxas altíssimas para usufruo dos espaços públicos (públicos?!). tentam agora votar leis permissivas para a última grande área de baixa ocupação no município, pressionando vereadores a votar projeto às pressas. não, não não, não, não, eis o recado atual da prefeitura.
o metrô prometido não chega jamais, a qualidade de vida se deteriora, ao menos existe uma coisa, uma resistência latente que por vezes tem mostrado sua cara, enquanto lacerda parece que não deseja sequer a reeleição, tal a estupidez com que encara a cidade onde não mora (ele vive em um condomínio em nova lima, o alphaville...)
sobre resistência poética em belo horizonte

o que todas estas situações tem em comum? é que se parte do simples preceito de que há eleições onde todos podem votar e que o voto de todos tem igual valor para se dizer que vivemos em plena democracia . para legitimar ações dos eleitos sem entender que toda eleição possui um contexto que torna o jogo político desigual para candidatos, que isso pode influir na condução de um ou outro despreparado ao poder, ou um montão deles como parece ser o caso do brasil! o maior dos despreparos é crer que após eleito, sem pensar nas condições anteriores, posteriores ou que atravessem o tempo, o candidato tem o poder de agir da maneira que bem entende em nome dos cidadãos dos quais recebeu os votos. a boa notícia é que as didaturas democráticas são por natureza enrustidas, não querem se assumir plenamente, o que dificulta que seu aparato apague oficialmente os preceitos democráticos contidos em algumas instituições. a democracia pelo contrário deve ser gritada aos quatro ventos, conquistada todos os dias. ainda que sejam esquecidos, tais preceitos se mantem como força latente, fio de ariadne que pode conduzir cabeças pensantes e questionadoras. repito, tecnocratas de direita ou esquerda precisam parar com a mania de achar que sabem o que as pessoas necessitam, mais do que as próprias pessoas.
dicionário: 

-burrice legalista
instrumento usado por burocratas ignorantes e/ou mal intencionados com o objetivo de desqualificar todo tipo de contestação a suas atitudes com base em detalhes de legislação dando a estes importância maior que aos fatos.

-desobediência civil
            instrumento anti legalista de pressão que ainda assim pode ser legitimamente democrático, ou em palavras mais simples, desrespeito à lei para que a lei se torne mais próxima dos desejos da população. atualmente há exemplos acontecendo em todo o território do brasil em greves de professores e outras categorias, em intervenções poéticas anti políticas de gentrificação, em cada palavra e pensamento de resistência ao status quo repressor.


sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

sobre passado, presente e futuro…(post antigo de um blog amigo)


nos anos oitenta, sob os protestos da população foi demolido o belíssimo cine teatro metrópole para dar lugar a um ridículo edifício bancário do bradesco. o metrópole, construído no lugar de nosso antigo teatro municipal possuía belíssimo projeto arquitetônico de raffaello berti, um dos fundadores da nossa escola de arquitetura da ufmg – a primeira do país – e pioneiro modernizador da arquitetura de belo horizonte ante ao ecletismo dominante.
há alguns anos atrás fomos surpreendidos pela triste notícia do fechamento do itaú cultural em belo horizonte localizado na rua do tupis bem próximo ao que foi o metrópole, ainda sob os apelos da classe artística de belo horizonte, naquela época carente de instituições culturais do gênero.
agora é a vez do instituto moreira sales, que no mês passado encerrou suas atividades em belo horizonte, assim como já havia feito em porto alegre, a instituição era notável e única por suas exposições na área de fotografia. atente-se ao fato de que a instituição criada pelos fundadores do unibanco concentra suas atividades culturais em são paulo justamente no ano em que tal banco, fundindo-se com o itaú cria a maior instituição financeira do hemisfério sul. para adoçar o natal(lembrem-se, a notícia é velha), recebemos então a notícia de que o cine usina unibanco – tradicional cinema de arte e promotor de um dos melhores festivais de cinema independente do país – está prestes a encerrar suas atividades diante do fim do contrato de patrocínio com -adivinhem! – o unibanco!
em pesquisa feita há alguns anos para identificar o perfil mais marcante da capital mineira foi detectado que tal caráter é inequivocamente o da cultura. apesar da proximidade com o magnético eixo rj/sp, que em um país periférico concentra a atividade e principalmente o financiamento da cultura, curiosamente bh segue produzindo e recebendo iniciativas do setor privado mineiro em produções de primeiríssima qualidade.
também há poucos anos foi criado um espaço livre enorme e ideal para apresentações ao ar livre, muito bem sucedido, se localiza em meio a diversos espaços culturais em área central da cidade, na praça da estação. outrora o lugar era um estacionamento e o seu fim não significou um colapso econômico ou de trânsito na área, ao contrário do que alguns acreditavam. um raro exemplo em que o poder público identificou uma demanda da população (é verdade que com o apoio de ângela gutierrez) para produção do espaço de nossa cidade, que paulatinamente vem perdendo sua qualidade de vida em prol da indústria automobilística. a escassez de espaços de lazer passivo – locais de encontro – nos leva a uma contraditória relação com os poucos que temos em bh. não raro é proibido deitar na grama, fazer piquenique, fazer barulho, etc, justamente nos locais onde tais atitudes não possuem caráter utilitário, de mercado, mas sim do lazer livre, gratuito e democrático, algo que mesmo em uma cidade atualmente empobrecida como buenos aires seria impensável ocorre aqui em um período de gastos faraônicos em obras “públicas”. fica no ar a pergunta, estamos fazendo nossa cidade para as pessoas que vivem nela? Qual é a perversidade de se possuir parques e praças para se ver de dentro do carro?
recapitulando, no caso dos bancos privados digo que é completamente injustificada a atitude diante do país ao se afastarem de uma atividade tão irrisória frente a lucros bilionários sempre divulgados com alarde,. atividades culturais que aliás descontam dos impostos mantendo apenas presença regular nas cidade onde pretensamente têm visibilide(publicidade). no caso de nossos agentes políticos fica um alerta e uma esperança, já moribunda, de que atendam aos apelos das pessoas que votaram neles para transformarem a nossa cidade segundo os desejos das pessoas que nela vivem, e não por razões eleitoreiras e tecnocráticas. no caso de todos nós peço o empenho que não tivemos em outros momentos para preservar aquilo que nos é tão caro e que, uma vez perdido dificilmente se recupera.
ps – a orquestra filarmônica de minas gerais, uma das melhores e mais jovens do Brasil teria sua sede no alardeado circuito cultural da praça da liberdade, o projeto vencedor de um concurso seria uma das melhores realizações de arquitetura contemporânea no Brasil e de arquitetos brasileiros. diante da impossibilidade de a obra ser terminada na administração aécio neves devido a trâmites burocráticos delicados e ao arrojo arquitetônico decidiu-se pela invenção de um museu para ocupar o mesmo espaço pois este ficará pronto em tempo da propaganda eleitoral. a orquestra se encontra sem sede oficial e sem perspectivas sólidas nesse sentido.
as antigas sedes do itaú cultural e do ims se encontram vazias.
sobre o fechamento do usina unibanco de cinema:
http://www.otempo.com.br/otempo/colunas/?IdColunaEdicao=10255
sobre a proibição de eventos na praça da estação, agora ela virou praia!!!!! vejam vocês:
surfe da praça da estação!!!
flor de maio

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

morte e vida severina


em primeiro lugar, devo me desculpar por ter me retirado por um tempo tão longo. sabem como é, fim de ano, interior de minas, cidade linda no meio das serras pedregosas, velhos simpáticos e sabidos, sítios em vilarejos bucólicos... se não sabem vou rezar pra que um dia descubram.

em pleno domingo e com uma ressaca que não chega a ser digna da abertura de uma nova década, sou acordado pelo celular. quem ousaria me acordar às 9 da madrugada?! um amigo querido, não atendo, depois ligo de volta e se for importante ele vai insistir. ele insiste e atendo. vem me perguntar sobre o deslizamento em angra dos reis, assunto batido e por isso mesmo, ao qual eu não havia dado a menor atenção em meu recesso "filosófico". ele me conta que um nosso colega estava lá e escapou, me pede notícias dos outros imaginando que talvez eu soubesse algo mais. ou só por querer conversar e ver que ao menos com alguém as coisas andavam tranquilas. no acidente morrera uma colega que eu não tive oportunidade de conhecer. se estivesse viva é possível que jamais soubesse quem era. o diabo é que para o tempo não existe "se", existe o passado que é irreversível e a nossa impotência enorme diante dele, somada à obrigação pesada do futuro.

http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI4183304-EI8139,00.html
(eis o ocorrido, para os ainda mais alienados que eu, para quem acreditar em jornal)

andei pensando em religião, em deus. não acredito em religião e desconfio deus. não, não cometi um erro ortográfico. desconfio deus pois fui criado católico em uma velha cidade mui católica, a mesma cidade de onde mirava a lua ainda ontem. desconfio deus pois olho pros cachorros e fico pensando que eles não entendem muito do que se passa à volta deles, do que os humanos fazem com eles lhes metendo injeções e coleiras de cheiro forte. simplesmente porque temos um cérebro mais ágil e somos "seres culturais". aquele papo de "penso logo existo" me leva ao "penso logo o pensamento, a cognição é possível. se existem graus de cognição, logo uma cognição ainda mais complexa e que não caiba em minha cabecinha curiosa(como a de um cachorro) pode existir. também não tenho razão alguma para ter certeza absoluta de algum tipo de divindade, ou de algum tipo de esfera sobrenatural. estou certo de que em religiões não acredito e de que converso com deus o tempo todo. isso tudo é natural ante à moral católica sob a qual nasci e cresci, da qual certamente guardo muita coisa sabida e escondida. converso com deus pois é meu jeito de viver minha solidão e isso pouco tem a ver com a existência de um interlocutor além de mim mesmo.

mas vejam como somos egoístas e materialistas. vejam como a morte é um mal que está dentro do peito de quem fica. é curioso e alguns julgam errado, o alívio que sentimos ao saber que conhecido algum estava no acidente, eu digo que certamente isso tem sua lógica. morte é coisa certa, mas jamais esperada de fato, sofrimentos devem ser escritos assim, no plural pois ao longo da vida vamos nos equilibrando entre um e outro até o dia em que caímos, não há ser que possa suportar toda a dor que há no mundo.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,



morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).

(trecho de Morte e Vida Severina, por João Cabral de Melo Neto)


e só assim conheci um pouco da yumi...

não me espanto com a falta de tato da imprensa diante do caso. já vi tragédia semelhante acontecer com um amigo falecido e já sabia como a coisa se dá, sei também da absoluta miséria editorial dos grandes veículos de imprensa em nosso país. não saberemos jamais o que se passou ali. ainda que tentemos nos aliar nessa dor aos parentes, aos amigos, aos que presenciaram a tragédia. pura ilusão que, pelo menos, ajuda a vender pra nós os mesmos jornais que criticamos. não vou me iludir em tentar consolar qualquer pessoa. ou vou e não vai dar certo. mesmo quem se diz desapegado tem lá seus amores e suas saudades. que chore muito quem tiver vontade. não resolve mas atende à ânsia do instinto.

neste ano novo três pessoas caíram da corda bamba. se estivessem dormindo em outro quarto, se houvessem ido àquela festa na cidade, se, se, se... não há. Como disse o Marquês de Pombal* "enterrem os mortos e alimentem os vivos" . a semana começou, temos trabalho a fazer, contas a pagar, férias para adocicar e mais um monte de coisas e tragédias que vão nos mostrando a cada dia que a vida muda muito pouco, e que o imprevisível é a unica coisa com a qual sempre podemos contar.
até o reveillon de 2011.

*em 1755, no dia de todos os santos, lisboa sofreu um dos maiores terremotos relatados na história. após os tremores que provocaram incêndios e mortes principalmente nas igrejas abarrotadas de fiéis, muitas pessoas se refugiaram na esplanada da parte baixa da cidade. após alguns minutos, tsunamis tomaram essa mesma esplanada, matando mais pessoas que o próprio terremoto. o marquês de pombal era então apenas um funcionário do rei. inquirido sobre o que fazer diante da situação pronunciou a célebre frase citada no texto. esse terremoto foi citado em muitos escritos iluministas por toda a europa, determinou muitos fatos da história posterior de portugal, e do brasil. inclusive que o pombal virasse o marquês.

o marquês de pombal
flor de maio